• 01/11/2019
  • por Resenha Politika

Entrevista

Lula é “enganador profissional”, diz Ciro Gomes; assista

Lula é “enganador profissional”, diz Ciro Gomes; assista

 relação entre o ex-presidente Lula e o ex-governador Ciro Gomes (PDT) está longe de ser retomada. Desde a eleição do ano passado, quando Lula insistiu na candidatura de Fernando Haddad em vez de apoiar Ciro e, depois, o pedetista se negou a pedir votos para o candidato petista no segundo turno, o clima é de guerra declarada entre duas das principais lideranças da esquerda e centro-esquerda do país.

 

Em entrevista exclusiva ao Congresso em Foco (veja a íntegra mais abaixo), o ex-candidato pelo PDT declarou que não recusaria um convite de Lula para conversar caso o petista saia da prisão. Mas deixou claro que dificilmente haverá um entendimento. Ciro chamou Lula de “enganador profissional”.

Ao relatar sobre o encontro mais recente que teve com Fernando Haddad, Ciro afirmou que a interação não passou de um abraço para foto. Ambos estavam presentes no evento de abertura do festival Cine Ceará, em Fortaleza (CE).

“Ele [Fernando Haddad] senta e quando acaba a solenidade, baixou o escurinho, levantou e foi embora, só quem assistiu ao filme fui eu. A fake news, a versão é o que importa agora. Nos cumprimentamos como sempre”, afirmou Ciro.

Jair Bolsonaro

Ao comentar sobre o presidente Jair Bolsonaro, Ciro o classificou como “paranoico” e disse que o vídeo no qual o presidente é comparado ao um leão atacado por hienas representando PSL, PDT, PSDB, PT, PSB, Psol, OAB, STF e outras organizações é uma forma de distrair as acusações que podem envolver Bolsonaro e sua família.

“O Bolsonaro tem uma lógica, é uma lógica estúpida, de um menino de 13 anos paranoico, mas a lógica dele é basicamente o seguinte, ele cria uma aberração qualquer todas as vezes que tem um fato real, grave, gravíssimo avançando na direção dele. O que precisamos neste momento? É não cair nesse jogo. As gravações do Queiroz [ex-assessor de Flávio Bolsonaro, apontado em relatório do Coaf como movimentador de transações financeiras ilícitas] revelam que ele é muito mais do que já se supunha que ele fosse. Ele está lidando com seres estratégicos com uma intimidade, naturalidade depois do escândalo já acontecido que revela também a renitência delinquente de um homem que tem dez homicídios nas costas e que faz parte de um grupo ligado às milícias do Rio de Janeiro”, declarou o ex-ministro.

E completou:

“É dinheiro roubado, usando a expressão popular, dinheiro subtraído dos cofres públicos pelo Bolsonaro, ele próprio deputado federal, pelos filhos senador, vereador, deputado estadual e a mulher dele, Bolsonaro, recebendo dinheiro do Queiroz, e a conexão com as milícias. Isso é o que precisa ser esclarecido, não adianta Jair Bolsonaro ficar inventando filmezinho, negócio de homem mijando em cima de homem como foi em outra ocasião o mesmo truque”.

Leia a seguir a íntegra da entrevista:

Congresso em Foco - O senhor tem viajado o país desde que acabou a eleição de 2018. Quais setores tem procurado mais nessas viagens? Seja partidos, movimentos sociais, entidades de classe.
Ciro Gomes - Quando você tira quase 14 milhões de votos, em uma democracia sadia, está longe de ser, mas eu colaboro para que ela seja, você recebe uma espécie de mandato também. Quem recebeu os 57 milhões recebe o mandato de governar e aquele que recebeu 14 milhões de votos tem a tarefa de cobrar, vigiar, apontar os defeitos e estou procurando fazer isso, exercitar essa honradíssima tarefa de construir um movimento, criar uma corrente de opinião que compreenda o que está acontecendo com o Brasil fora das paixões e ódios reducionistas que estabelece uma espécie de simbiose, um parasitismo recíproco entre o bolsonarismo e o petismo corrupto, e propor soluções. A cada crítica tenho me obrigado a estudar e a propor alternativas, isso preferencialmente são meios universitários porque meu foco é criar essa corrente de opinião, mas eu tenho circulado também em ambientes populares, todos os convites que recebo, tenho circulado.

Houve, desde a eleição, um movimento progressista na internet, dentre os nomes posso destacar o do Henry Bugalho, por exemplo, como está esse movimento para 2020?
Estamos explicitamente dedicados a construir uma corrente de opinião, o trabalhismo, ambiente onde atuo, faço a minha militância, está aberto a novas filiações, mas esse movimento extrapola o PDT e tem um foco na juventude universitária por uma circunstância prática, eles são a um só tempo as maiores vítimas do que está acontecendo com o Brasil e têm o potencial de capturar os conceitos um pouco mais elaborados no ambiente que a política a redução o tempo inteiro. Saiu o Datafolha mostrando o desmilinguir da popularidade do Bolsonaro e ele então faz um discurso dizendo que, claro que está errado, vai procurar corrigir, mas que as pessoas não ataquem muito se não o PT volta. No mesmo dia, a [presidente nacional do PT] Gleisi Hoffmann, que é líder dessa quadrilha que hegemonizou o PT, diz que não existe centro no Brasil, o que existe no Brasil é o PT e Bolsonaro. Eu acredito que este reducionismo está fazendo muito mal ao Brasil, foi isto que produziu o bolsonarismo e a gente precisa construir um caminho para sair disso.

Como avalia esses 10 meses do governo de Jair Bolsonaro?
Está pior do que supunha porque a Presidência da República tem uma capacidade convocatória absolutamente extraordinária. Essa capacidade convocatória é declinante com o tempo, mas ela no primeiro dia do governo, entre a eleição e a posse, atinge o limite máximo, que praticamente 100% das energias do país estão disponíveis para uma convocação do presidente. Qual não é o meu susto, embora não esperasse nada bom do Bolsonaro, mas é muito pior porque ele se cerca de um governo que tem basicamente três vetores: uma pseudo racionalidade neoliberal mofada que não conhece o Brasil, que é o Paulo Guedes, um núcleo que estou chamando de praça da alegria, um bando de louco, alucinado , esse ministro do Meio Ambiente [Ricardo Salles], o ministro das Relações Exteriores [Ernesto Araújo], a ministra da Mulher [Damares Alves], e esse núcleo militar também corrompido, corrompido pelo poder, que pensou que ia tutelar o Bolsonaro e na verdade está sendo usado pelo Bolsonaro para navegar esse projeto de poder abirobado que ele tem.

Tem algum ministro que o sr. considere que esteja fazendo um bom trabalho?
O ministro da Infraestrutura [Tarcísio de Freitas] não destoa sob o ponto de vista de qualificação. O Paulo Guedes é uma pessoa respeitável por mim, ele não conhece o Brasil, é intoxicado ideologicamente, nunca compreendeu, nem jamais compreenderá o Brasil, parou de ler há muito tempo, mas é uma pessoa tratável, respeitável sob esse ponto de vista. Mas esse ministro do Meio Ambiente é um bandido, esse ministro das Relações Exteriores é um lunático e por aí vai.

O que o governo pode fazer sobre as manchas de óleo nas praias do Nordeste?
Discriminar uma região atenta contra a unidade nacional, que é um dos casos clássicos de crime de responsabilidade. Eu tenho até defendido que o Ministério Público deveria abrir uma investigação para compreender, já se passaram 60 dias e não há nenhuma providência estratégica nas duas obrigações inadiáveis, uma é a contenção do dano que ainda está se aprofundando, fui visitar agora o litoral, e o dano econômico, o que está acontecendo agora? Muita gente cancelando visita turística, que já um prejuízo extenso, e todo mundo que vive da pesca está começando a sofrer porque as pessoas não compram mais com medo da intoxicação. De outro lado a identificação dos responsáveis por isso, é preciso pedir cooperação internacional, não é razoável que a altura dessa fiquem em especulação pirada, ideológica ao invés de abrir um inquérito sério, pedir cooperação internacional, tem hoje satélite geoestacionário, memória de vídeo de tudo que acontece no planeta Terra em tempo real com memórias recuperáveis, tem o mapeamento dos fluxos de petróleo, mapeamento das correntes marítimas, dos ventos. Com o cruzamento disso, acredito que seria muito difícil a gente não identificar e cobrar a indenização.

O governo extinguiu em abril um comitê responsável por lidar com catástrofe por óleo e além de acusar a Venezuela, o governo acusou o Greenpeace de fazer esse derramamento.
Esse ministro do Meio Ambiente é um bandido, não é uma expressão mais quente, mais calorosa, ele é condenado por improbidade [quando secretário de Meio Ambiente do ex-governador de São Paulo Geraldo Alckmin (PSDB)] porque fraudou mapas da bacia do rio Tietê para privilegiar interesses econômicos. Ele tem seu sigilo bancário e fiscal requerido a queda porque ele é um bandido. Ele está posto por Jair Messias Bolsonaro para ser bandido, que é o que ele de fato é.

Foi divulgado e depois apagado pelo Twitter do presidente Bolsonaro um vídeo no qual ele é comparado a um leão atacado por hienas que seriam o PSL, PSDB, PT, PDT, PSB, STF, OAB, entre outros.
Se você reparar, o Bolsonaro tem uma lógica, é uma lógica estúpida, de um menino de 13 anos paranoico, mas a lógica dele é basicamente o seguinte, ele cria uma aberração qualquer todas as vezes que tem um fato real, grave, gravíssimo avançando na direção dele. O que precisamos neste momento? É não cair nesse jogo. As gravações do Queiroz revelam que ele é muito mais do que já se supunha que ele fosse. Ele está lidando com seres estratégicos com uma intimidade, naturalidade depois do escândalo já acontecido que revela também a renitência delinquente de um homem que tem dez homicídios nas costas e que faz parte de um grupo ligado às milícias do Rio de Janeiro. É dinheiro roubado, usando a expressão popular, dinheiro subtraído dos cofres públicos pelo Bolsonaro, ele próprio deputado federal, pelos filhos senador, vereador, deputado estadual e a mulher dele, Bolsonaro, recebendo dinheiro do Queiroz, e a conexão com as milícias. Isso é o que precisa ser esclarecido, não adianta Jair Bolsonaro ficar inventando filmezinho, negócio de homem mijando em cima de homem como foi em outra ocasião o mesmo truque.

Como está a conversa com o PT?
O Lula não está nada bem. Só esclarecer, se alguém vir uma única sozinha declaração minha me queixando de que o PC do B não veio para mim, foi para o PT, então Lula terá razão, mas ele está mentindo, nunca fiz essa queixa, jamais fiz essa queixa. O que eu tenho clareza é o seguinte, com esta quadrilha que hegemonizou o PT eu não ando mais. Eu respeito muito o militante médio do PT, sei bastante bem separar o joio do trigo, se você pegar Olívio Dutra, Raul Pont, Henrique Fontana, nenhum deles está envolvido em nenhuma falcatrua. Se pegar Eduardo Suplicy, não está envolvido em falcatrua. Se pegar Tarso Genro, enfim. Apoiei o Rui Costa [governador da Bahia], apoiei o Camilo Santana no meu estado nesta eleição, apoiei o Wellington Dias no Piauí nesta eleição, apoiei o Tião Viana no Acre  de novo nesta eleição [Marcus Alexandre foi o candidato do PT na sucessão de Tião Viana. Ficou em 2º lugar, atrás do governador Gladson Camelli, eleito pelo PP]. Vamos separar bem as coisas, esta burocracia é responsável pela debacle econômica mais grave da história do Brasil. O PT está forjando uma novilíngua porque basicamente eles querem lembrar do período Lula em que o consumo cresceu de forma bastante generosa pelo salário mínimo que melhorou, pelo crédito que explodiu de 17% para 55% do PIB, isto tudo é verdade. Vem a Dilma e pega o desemprego em 4% e entrega com 14%, não consegue reunir um terços dos deputados federais no primeiro ano de governo. A Dilma que entra e promete uma faxina, faxina de que, cara pálida? Quem faz faxina está limpando o que? Sujeira, quem produziu a sujeita? Ela nomeou Geddel Vieira Lima para a vice-presidência da Caixa Econômica. O Lula nomeou Geddel e o Gedddel aquele que usa 51 milhões de reais dentro de mala em um apartamento. Quem nomeou a diretoria da Petrobras toda que a Dilma afasta como uma faxina? Parece assim que o povo é imbecil, eu não sou. Em um momento para diante, sabendo o que eu sei, se eu não rompo, eu sou cúmplice.

Em entrevista à Revista Congresso em Foco, o senador Paulo Paim afirmou que o PT devia ter apoiado o senhor em 2018. Se o PT tivesse apoiado, o senhor aceitaria?
Outro petista, Paulo Paim, cadê Paulo Paim? Só tenho elogios. Não [aceitaria o apoio do PT], o meu plano não era esse, meu plano era apresentar uma alternativa, eu achava que se o PT tivesse um pingo de apreço ao país e pensasse um minuto no Brasil e nos brasileiros e não em si próprio como máquina de poder pelo poder, eles poderiam não ter lançado candidato. Se o PT vem comigo, quem iria perder era eu porque a força dominante naquelas eleições muito justamente, ou parte injustamente porque a vida real é assim, era o antipetismo, se o PT vem comigo eu perdia a eleição.

O governador do Ceará, Camilo Santana, falava desde 2017, mais de um ano antes da eleição, que defendia uma chapa com o senhor e Fernando Haddad e essa declaração nunca foi desautorizada pelo senhor.
Eu tive essa conversa com Haddad e disse para ele que primeiro a natureza do PT é como a do escorpião, não me apoiaria em nenhuma circunstância. A segunda questão é que o PT preferia perder na eleição, obviamente o Lula. Luiz Inácio Lula da Silva, que é um gênio da política sabia que a eleição estava perdida e resolveram fazer aquilo que ele sempre fez, cuidar do PT. O Lula faz uma fraude, vamos ter conveniência, não é possível que o Brasil esteja tão anestesiado, que a generosidade do nosso povo com Lula seja tanta que se esqueça tudo. Quem botou a Lei da Ficha Limpa em vigor foi o Lula, contra a minha opinião, por quê? Eles hoje estão advogando que a prisão em segunda instância não é correta. Pois bem, o que é a Lei da Ficha Lima se não a subtração dos direitos políticos de um cidadão subjudice? Cuja sentença não transita em julgado ainda. Dentro do melhor direito é uma aberração, pois ele bota em vigor a lei e depois se apresenta como candidato? Todo mundo sabia que ele não podia ser candidato e o Haddad se presta a essa fraude e no limite ele queria que eu me prestasse a essa fraude, eu recusei.

Se Lula for solto, procuraria ou aceitaria conversar com ele caso ele convidasse?
Eu não me recuso a conversar com ninguém, mas não tenho nenhum apreço político pelo Lula, nenhum. Acho que ele é o grande responsável por essa tragédia econômica, social e política que o Brasil está vivendo, não tem grandeza, só pensa em si e virou um enganador profissional. Eu vi a última entrevista dele e fiquei chocado, disse que acertou com Eduardo Campos para sucedê-lo, mentira, mentira, ele vetou a candidatura de Eduardo Campos a governador [em 2006, o PT lançou Humberto Costa candidato ao governo de Pernambuco] e o Eduardo Campos chegou na minha sala chorando, trabalhávamos no mesmo prédio [Campos era ministro da Ciência e Tecnologia e Ciro da Integração Nacional]. Liguei para o Lula e fui diretamente lá exigir a retirada do veto. O Eduardo Campos foi candidato e eles fizeram o diabo para derrotar Eduardo Campos.

Passando um ano desde a eleição, ao que o senhor credita a sua derrota?
Isso não tem culpa, é falta de voto, a única explicação para derrota eleitoral é que meu adversário teve mais voto que eu.

Como virar isso na próxima eleição?
Na minha mente, ideia, exemplo e militância.

Faltou isso em 2018?
Faltou tudo, no ambiente em que a principal força, isso a gente vê depois, não vê com tanta clareza antes, a principal força dominante no país do Sudeste para baixo e no Centro-Oeste era o antipetismo. Portanto a ideia minha estava mais ou menos sombreada porque corretamente as pessoas me identificaram como aliado do PT. Eu era o segundo voto da esquerda, o segundo voto da direita, mas o primeiro voto era o antipetismo. A grande elite tentou o Alckmin, não era Bolsonaro, engoliu o Bolsonaro, mas engoliu com muita distância porque o Amoedo não deu no coro, o Meirelles não deu para cima. Eu fiquei com 38 segundos [de tempo de propaganda eleitoral] na televisão.

A ex-senadora Marta Suplicy pode se filiar ao PDT?
Eu não conversei com a Marta, não, somos amigos de longa data, mas quem está conversando com ela é o Lupi [presidente nacional do PDT]. Estamos conversando com todo mundo, temos uma conversa por exemplo com ACM Neto [presidente nacional do DEM e prefeito de Salvador], conversa relativamente amiúde com Rodrigo Maia. Com Rodrigo Maia nós fizemos uma exigência para apoiá-lo para presidente da Câmara e ele está cumprindo rigorosamente. Exigimos dele duas coisas, que garantisse o espaço de contenção de danos que nós precisamos ocupar e ele está cumprindo rigorosamente, já conseguimos várias proezas no Congresso, sendo uma bancada pequena. A outra é obrigar o Bolsonaro ao jogo democrático, ele está cumprindo exemplarmente. A história vai registrar por exemplo que ele foi o mais gravemente responsável por impedir que o Bolsonaro levasse o Brasil a uma guerra contra a Venezuela.

Acha que na reforma da Previdência, Maia conseguiu conter os danos?
Sim, ele é diferente de tudo que a gente pensa, tem um pensamento absolutamente conservador, alinhado a essa economia rentista, do baronato financeiro do Brasil, e nosso compromisso não é tirá-lo dessa condição, é garantir por exemplo que nas comissões especiais que nossa participação seja garantida, nossos requerimentos sejam considerados e sejam deliberados, a gente sabe que somos minoria e nesse sentido ele tem cumprido 100% do que acertou conosco.

Tanto na Câmara quanto no senado teve gente do PDT que votou a favor da proposta do governo, defende que Tabata Amaral e Kátia Abreu tenham o mesmo tratamento por votarem pela reforma da Previdência?
Votar a favor do governo nesse tipo de Previdência não guarda a menor coerência com um partido trabalhista, partido que carrega a memória de Getúlio Vargas que foi quem criou a Previdência Pública no Brasil. Tem um rito, esse rito foi seguido religiosamente, foi matéria de convenção nacional, todo mundo teve o direito de contestar posição e ninguém contestou, foi unânime a posição de fechar questão contra e hoje temos clareza que o partido tem rumo, rumo estratégico.

Acredita que no campo da direita o DEM possa se fundir com o PSL e no da esquerda uma fusão entre PDT e PSB?
Não é provável nem aquilo nem isto porque hoje com questão do fundo eleitoral, tendo por critério bancadas, imaginar que o PSL vai se fundir com o Democratas, quem vai dirigir esse partido? Portanto quem vai ficar com caneta do fundo eleitoral gigantesca se isso acontecer? Não há a menor probabilidade. Nós aqui respeitamos muito os nossos parceiros do PSB, é um partido grande, temos um diálogo com o PSB que é histórico, antigo e vamos manter esse diálogo, mas fusão não é provável.

Tem participado das discussões sobre reforma tributária? Em linhas gerais, qual seria a reforma defendida pelo senhor?
As duas propostas que estão tramitando, nenhuma delas merece o nome reforma tributária. São duas iniciativas de simplificação da administração tributária para atender aos empresários, o que não é ilegítimo, mas ela não cumpre as outras graves tarefas de uma coisa que mereça o nome de reforma tributária. A primeira é o financiamento eficaz do setor público, a segunda é a progressividade, a ferramenta mais relevante na distribuição de renda. Só o Brasil e a Estônia não cobram impostos sobre lucros e dividendos, eu cobrei quando fui ministro da Fazenda do Itamar [Franco, presidente do Brasil entre 1992 e 1994], Fernando Henrique revogou e o lulopetismo manteve revogado. Ninguém é de esquerda porque se afirma de esquerda. Só Brasil e Estônia não cobram sobre lucros e dividendos. Você tem hoje as renúncias fiscais, antes de fazer uma reforma tributária, você tem aí 350 bilhões de reais este ano de renúncia fiscal sem nenhum critério. Em tempos de crise, nós já fizemos no Ceará, por que você não desconta 20% disso? As duas providências acabam com o déficit. Você tem o ITR [Imposto sobre a Propriedade Rural] no Brasil, nessa grande fazenda do agronegócio mundial que é o Brasil, recolhe um bilhão de reais por ano, o IPTU da classe média recolhe 20 milhões de reais. Imposto sobre grandes heranças, acima de 3, 4, 5 bilhões de reais, nos Estados Unidos é 40%, no Brasil é 4%. Essa reforma passa longe de uma reforma tributária verdadeira.

O governo tem falado de desonerar empresas.
A proposta do Guedes seria criar uma nova CPMF. Eu propus abrir a discussão na campanha porque considerava decente legitimar isso no processo eleitoral, eles [ campanha de Jair Bolsonaro] ficaram violentamente contra. O Guedes, talvez essa vai ser a razão final para ele ir embora, quer propor uma CPMF ainda mais dura que eu propus porque eu criava uma faixa de isenção de até 5000 reais por CPF/MEI. Era uma coisa só para o andar de cima e ganharia 60, 70 bilhões de reais. Eu tinha como virar o jogo do déficit público brasileiro em 24 meses apenas por conta da anterioridade, fiscalmente você tem condições de virar o jogo em 12 meses. Qual era a lógica do Guedes? Propor esse tributo e tirar a contribuição patronal da folha de pagamento. Isso é uma aberração, você acaba de fazer um sacrifício imenso para fazer uma reforma da Previdência que pesa 83 em cada 100 reais de quem ganha até 3000 reais de salário e vai agora desonerar dois terços da arrecadação da Previdência. Temos que fazer uma reforma previdenciária séria, essa reforma previdenciária séria foi proposta por nós na campanha enquanto Bolsonaro dizia com todos os esses e erres que era contra. Falava que [se aposentar aos] 65 anos é um absurdo, como falava em privatização, a entrega criminosa, o Fernando Henrique devia ser fuzilado porque vendeu a Vale do Rio Doce. Agora está aí como mascate de quinta categoria entregando as riquezas do Brasil aos estrangeiros.

Acha que há consenso hoje no país para algum tipo de reforma tributária?
Não é provável. Estamos no pior momento para propor uma reforma tributária, momento de déficit grave. Toda e qualquer reforma tributária que vai em direção de atender ao empresariado diminui a receita e o governo pode abrir mão de receita neste momento? Tanto que o governo até o presente momento não tem proposta nenhuma. Essas propostas que estão circulando e a gente está esmiuçando é inacreditável. Por exemplo diminuir a incidência dos bancos, o único setor que está nadando de braçada com a economia real toda indo para o vinagre, os bancos têm o maior lucro dos últimos 25 anos, e olhe que o lucro do governo PT foi sem precedente internacional. Isso é ser de esquerda para essa burocracia corrompida do PT, ser de esquerda é garantir a concentração de 85% das operações financeiras em apenas cinco bancos, é fazer a população carcerária, o jovem negro, subir de 270 mil para 720 mil, é resolver o problema depois de 14 anos da saúde pública do Brasil trazendo médico de Cuba, não alteraram uma linha na questão da formação. É basicamente um projeto de país que não tem, o projeto deles é poder pelo poder. Hoje os bancos pagam ISS sobre as tarifas, estão fundindo o ISS com o IVA, que é o que vai se chamar IBS nessa duas propostas [IVA é o imposto unificado no texto do Senado e IBS é o do texto da Câmara], só que os bancos pagam Contribuição Social sobre Lucro Líquido sobre PIS/Cofins na rentabilidade das transações financeiras, como eles vão trazer isso também para dentro [do imposto unificado], fica desonerado o banco. Por que não temos uma reforma tributária correta? As melhores prática internacionais cobram IVA, qual é característica do IVA? Imposto sobre consumo destacado na nota e cobrado no destino. Nunca São Paulo vai permitir que isso se enquadre no Brasil. Isso será apoiado por Minas, Rio e e Rio Grande do Sul. O ICMS, que foi imposto pela ditadura e foi recopiado pela Constituição de 1988, que foi o Serra que fez, o que acontece? Hoje o sistema de tributação no consumo brasileiro é cobrado na origem. Se hoje lá no Ceará o camarada paga 17% em uma televisão, 8% vai bater em São Paulo. Se eu cobro um IVA, esses 17% ficam lá, São Paulo perde 8%. São Paulo está com a linha dada para quebrar, não quebrou ainda porque faz quatro anos que não reajusta os funcionários e passou oito meses sem pagar dívida com uma liminar, dessas aberrações que acontecem no Brasil. Posso até ser surpreendido, mas São Paulo está com a linha dada no nariz para se afogar, vai deixar? Vão criar o IVA que é um mostrengo. Eu crio um IVA no destino, mas pego a receita adicional que der, boto em um fundo para São Paulo, ora, isso é um ICMS.

Quem será o candidato do PDT em São Paulo ano que vem? Marta Suplicy é uma opção?
Vamos dar o tempo dela, não vamos especular isso não.

Lula fez em entrevista ao Uol uma analogia com o filme Central do Brasil, se comparou a personagem da Fernanda Montenegro e disse que o senhor é o menino rebelde que ela tenta ajudar.
Ele não está nada bem porque não entendeu nada do filme ou ato falho, que mais Freud explica do que eu. O personagem da Fernanda Montenegro é uma velha picareta, desonesta, que rouba, recebe dinheiro do povo para escrever cartas , do povo analfabeto mais simples e joga as cartas fora e fica com o dinheiro do povo. Ela estava negociando o corpo do menino, que ia ser assassinado, para vender os órgãos do menino. Esse é o personagem que o Lula assumiu para si e eu seria o menino, ele não está nada bem.

Depois do encontro no Cine Ceará, houve alguma conversa com Fernando Haddad?
O festival Cine Ceará acontece todo ano e eu tenho história de comparecer,ajudei a consolidar o festival e fui ver o filme [A Vida Invisível de Eurídice Gusmão], filme espetacular de um diretor cearense [Karim Ainouz] com a Fernanda Montenegro que é uma querida amiga de 30 anos, minha eleitora inclusive, que o Lula fique sabendo. Ele [Fernando Haddad] senta e quando acaba a solenidade, baixou o escurinho, levantou e foi embora, só quem assistiu ao filme fui eu. A fake news, a versão é o que importa agora. Nos cumprimentamos como sempre.

Mas ele tem procurado o senhor depois da eleição?
Não, nem no dia da eleição, esse povo não gosta muito da verdade, não. Aqui meu telefone, meu sigilo de telefone, se tiver uma ligação dele aqui você pode ficar com meu braço.