• 24/04/2019
  • por Resenha Politika

Segurança Pública

Facções mudam atuação após enfraquecimento dos grupos nos presídios do Ceará

Facções mudam atuação após enfraquecimento dos grupos nos presídios do Ceará

Nem guerra, nem trégua. Quase quatro meses após a retomada do controle das penitenciárias do Ceará pelo Estado, com o fechamento de 98 cadeias públicas vulneráveis e a apreensão de quase 3.500 celulares, o poder de articulação das facções criminosas foi abalado. E diante do novo cenário, essas organizações - que protagonizaram juntas o 15º ciclo de atentados, registrado no início do ano - têm adotado uma postura de tolerância entre si nas ruas.

É o que revela a apuração realizada pelo O POVO. Enfraquecidas no âmbito do sistema prisional e consolidadas nos territórios dominados após a carnificina de 2017, com seus 5.134 homicídios, as facções criminosas caminham agora para estabelecer um "modelo de negócios". Dedicados ao tráfico, e não mais à guerra, esses grupos teriam, mais uma vez, influenciando na queda das estatísticas de homicídio do Ceará.

"Desta vez, não há uma pacificação. Não oficialmente. Ninguém fala sobre isso, mas o que a gente tem notado é que há certa tolerância. Cada um faz seus 'corres', cuida das suas coisas. Em alguns territórios, houve até colaboração", descreve uma das lideranças sociais ouvida pelo O POVO, que atua nas comunidades do Grande Jangurussu, Grande Bom Jardim e região da Barra do Ceará, na Capital.

"Em um desses bairros, nessas grandes operações, aconteceu de a Polícia Civil dar o bote no grupo de uma facção e o pessoal fugir pelo lado dos rivais, com o consentimento deles. O pessoal da outra facção deixou eles passarem pelo território. Eles permitiram", descreve.

A fonte, que não será identificada por questões de segurança, detalha que ainda há, no entanto, alguns pontos de conflito constante. As chacinas, contudo, se tornaram pontuais e passaram a ter motivos outros. Prevalece, agora, a acomodação nos territórios, além de "colaborações momentâneas".

"Nas ruas, a facção não perde poder. Nos presídios, eles (Estado) realmente apertaram, mas só nos pequenos. Uma ou outra liderança. Mas ainda há comunicação com a rua. Os caras falam: 'eles não são doidos de mexer com nois (sic)'. Os grandes estão de tranquilos. A piaba é que está se ferrando", descreve.

Sobre a redução de 56,6% no total de Crimes Violentos Letais Intencionais (CVLI) no Ceará, no primeiro trimestre de 2019, se comparado a 2018, a fonte é enfática. "Não há política pública que dê conta de uma redução de 60% nos homicídios. É surreal. Assustador. E não apenas no Ceará. Veja o Rio Grande do Norte e Alagoas. Também teve queda. Ou há um esgotamento, ou um movimento de região", analisa.

Em fevereiro último, o Rio Grande do Norte registrou uma redução de 42,7% nos assassinatos. Já em Alagoas, no mês passado, houve 101 mortes em todo o Estado, foi o menor número desde o início da série histórica, em 2011.

"Acabou a disputa. Eles se estabeleceram. Foi importante essa retomada dos presídios. Tudo estava muito abusivo. Mas, na porta de saída das facções, o Governo não tocou. Acredito que a gente caminha, talvez, para uma nova pactuação. As rotas de tráfico se ampliaram. Novos aeroportos ou portos. Caminhamos para uma postura de negócios", conclui a fonte.

Facções continuam inimigas, mas estão desestruturadas, diz secretário

A intervenção realizada no sistema prisional do Ceará foi determinante para a queda dos homicídios no Estado, avalia o titular da Secretaria da Administração Penitenciária (SAP), Mauro Albuquerque. Segundo ele, a quebra na comunicação dos criminosos, decorrente da apreensão dos celulares, bem como a descapitalização desses grupos, com a inibição do cometimento de crimes no âmbito das penitenciárias, desestruturou as facções, dentro e fora das muralhas.

O resultado, explica Mauro, foi um recuo na guerra por territórios. Porém, assegura ele, não há "tolerância". "Eles continuam inimigos. O que não estão fazendo é se bater abertamente. Estão sem condições de se enfrentar nas ruas. Estão desestruturados. Antes, eles usavam muito do dinheiro que vinha de dentro do sistema para isso", defende.

O Povo

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